O PATRÃO

***
─ Que foi isso!

─ Estava na ceifa e caiu...

─ Alguma pinga de vinha, naturalmente. Estou farto de dizer que, neste outeiro não quero gente bêbado.

─ Não é isso, patrão. Já é velha... O cansaço entrou com ela.

─ Pior ainda. Estou farto de dizer aos capatazes que só me tragam gente sã. Pagar caruncho não me serve.

─ O ceifeiro olhava-o de expressão parada. Os pensamentos corriam-lhe em tropel pelo cérebro.

─ Vai-te lá. E asas nesses pés, que eu não te pago para andares com velhas às costas.

Deu de esporas ao cavalo, antes que o ceifeiro respondesse, mas ficou a ruminar.

E voltou atrás.

─ Ouve cá!... Quando se fala comigo, quero esse chapéu fora da cabeça.

O outro mostrou-lhe a companheira e não deu palavra.

─ Pois sim!... Mas é para tu saberes. Faltas de respeito é que não!... Isto aqui anda tudo afinado, ou acaba-se o trabalho. Para sempre, percebeste?... Não tenho medo que não me gramem.

Nos olhos do ceifeiro havia agora um clarão de ira.

─ Vai-te lá. E não me faça essa cara, que o medo não me conhece. Faltas de respeito é que não consinto!

O ceifeiro rebelde queria abrir o coração a todos os homens, mais alguns só lhe pediam ódios e ele tinha de os odiar tanto como amava os outros.

─ Faltas de respeito é que não!... ─ insistiu ainda o lavrador.
***

Alves Redol
(Adaptado)
O patrão, texto adaptado de Alves Redol






 

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